segunda-feira, dezembro 20, 2004

No comboio

Querido Luís,

Estamos quase em casa. Ao mesmo tempo que vejo mexer a boca do senhor que se sentou à nossa beira no comboio, recordo a tarde que passamos juntos. Tinha pensado ir ver o concerto só contigo, mas apareceu na estação o Helder do 11º ano, que por coincidência tinha os mesmos planos que nós. Confesso que fiquei um pouco desiludida por perder a oportunidade de passar tanto tempo - que, no fundo, me parece tão pouco - sozinha contigo. Mas o Helder é muito boa pessoa e nunca está a mais!

O concerto começou com um atraso significativo, porque o maestro pensou que estava marcado para a noite! Valeu a pena esperar e perder o comboio no qual tínhamos planeado voltar, porque foi um óptimo espectáculo.

Apercebo-me de que o senhor parou de falar e espero que não seja suposto eu responder, embora tenha ideia do assunto pouco interessante que abordávamos. Aliás, que ele abordava sozinho! Volta e meia, ele lá se mete na nossa conversa, mas eu vou tentando rodar a cabeça para a esquerda, onde estás tu e o Helder, a ver se o homem se apercebe que está a meter o nariz onde não é chamado.

De repente, o Helder lembra-se que não tirou bilhete! Levanta-se para ir resolver o problema com o revisor e eu aproveito para me chegar um lugar para a esquerda, de forma a ficar mesmo em frente a ti. Lá foi resolvido da melhor forma a questão do bilhete e a viagem continua. Uma miúda pequena começa a puxar-nos para a brincadeira. É mesmo daquele tipo de crianças que quase não suporto! Desobediente, insistente, até um pouco mal-educada. A dada altura, passo a ignorar. Não faz diferença, temos que sair na próxima estação.

Sei que vou para casa com uma convicção que já tinha: és uma companhia formidável para tudo!