domingo, outubro 31, 2004

Amanhã é feriado

Querido Luís,

Amanhã é feriado. Amanhã é mais um daqueles dias em que temos que nos vestir de luto para ir ao cemitério visitar os parentes que nunca chegámos a conhecer. Eu vou trocar isso pelo peditório para a Liga Portuguesa Contra o Cancro. Suponho que farias o mesmo, quem sabe se não o farás realmente...

Amanhã é feriado e não te vou ver. Ou talvez te veja em cada moeda a tilintar na minha latinha. Porque sei que tu também contribuirias para esta nobre causa, sem saberes que ao mesmo tempo estavas a acender uma luz dentro do meu peito, reflectida no meu rosto em forma de sorriso.

Amanhã é feriado. Não te vou ver, mas vou estar contigo. Prometo carregar-te no meu pensamento com a mesma dedicação que carregarei a minha latinha ao pescoço. Prometo orgulhar-me de cada donativo como me orgulho de ti. Prometo oferecer cada autocolante amarelo com o carinho que desejo oferecer-te para o resto da vida.

Amanhã é feriado, mais um dia sem te ver. Amanhá é feriado, mais um dia para sonhar...

sábado, outubro 30, 2004

Tão longe e tão perto...

Querido Luís,

Estás tão longe e tão perto...

Chegámos ao fim de uma semana que, em geral, pretendo esquecer. Dois jogos para o torneio de basquetebol inter-escolas, um relativamente bom, outro péssimo... Ontem, depois do jogo (o péssimo), decidi desaparecer. Tomei banho em tempo record e abandonei o ginásio tentando conter-me para não chorar à frente de toda a gente, principalmente da treinadora, a qual me fez uma série de críticas injustas.

Já não ia à igreja há muito tempo, mas senti que era o único sítio onde poderia chorar à vontade e deixar sair aquela angústia nervosa que sentia. Chorei à vontade... Pouco depois uma luz colorida reflectiu-se sobre mim. O sol estava mais forte e provocava este efeito através dos vitrais. Aquilo animou-me e quando já tinha libertado tudo o que havia para libertar, olhei à minha volta. Estavam no máximo quatro pessoas na igreja. Podia ouvir uma senhora já com uma certa idade a murmurar qualquer coisa, concerteza seria uma oração... Sentei-me muito direita e puxei o cabelo para trás das costas. À minha frente estava outra senhora de pé, virada para mim, com um ar intrigado, talvez por não estar habituada a ver ali gente jovem, muito menos com cara de choro.

Voltei para a escola a correr, sem ter ainda almoçado, porque ia ter uma aula para a qual já estava atrasada. O Pedro estava à minha espera no portão. Eu tinha combinado ir almoçar com ele, mas não me apetecia sequer atender o telefone, por isso, não o avisei e ele ficou de plantão, sem saber o que se passava. A única pessoa com quem me apetecia estar eras tu. Tu e mais ninguém...

Gostava tanto de poder dizer-te que és importante e o quanto me fazes sentir bem. Gostava que soubesses que me tornas uma pessoa melhor, quando estás por perto. Gostava de te explicar como me fazes mais feliz, como fez aquele jogo de luzes coloridas da igreja. Gostava de partilhar contigo todos os meus segredos, todas as minhas ideias e todos os meus pensamentos. Gostava que estivesses comigo aqui e agora e de te transmitir no silêncio de um olhar tudo aquilo que eu sinto por ti, o melhor que um ser humano pode sentir...


quinta-feira, outubro 28, 2004

Encantada!

Querido Luís,

Tudo o que vem de ti é espontâneo. Como esse prelúdio que me tocas numa sala da academia. E pensar que eu deveria estar a estudar violoncelo...! Mas apeteceu-te não negar o meu pedido e agora estou aqui sentada, completamente presa à tua música, desejando não sair nunca mais desta prisão...

Desejo que todo esse encanto nunca termine, desejo nunca perder o teu sorriso de bom dia, as conversas de corredor, as piadas às quais só nós conhecemos a origem, aqueles momentos mágicos que dás à minha vida quando ouço a tua voz ou vejo a tua silhueta ao fundo da rua.

E para sempre me mostrarei como agora, enquanto ouço aquela que me parece ser a melodia mais perfeita do mundo... encantada!

segunda-feira, outubro 25, 2004

Um belo dia de sol de Outono...!

Querido Luís,

A manhã foi extenuante. Um teste de Filosofia, daqueles de puxar pela argumentação tal advogado que tenta defender um serial killer de crianças.

Temos agora Português. A professora espera-nos no corredor, mais de metade da turma está atrasada, devido ao prolongamento do teste antes do almoço. Sais da biblioteca com um ar fresco, como se não tivesse passado por ti todo o alvoroço que uma prova causa a qualquer comum mortal. Não te digo nada, apenas sorrio. Entramos juntos na sala de aula, ainda somos poucos, mas a professora decide não esperar mais e começa a desbobinar a matéria. Estou especialmente concentrada, embora não deixe de me embevecer cada vez que emites um som, cada vez que fazes um gesto, ainda que seja para coçar a sobrancelha... E continuo atenta à tua expressão relaxada que consigo observar através do reflexo na janela.

Termina a aula e o Pedro vai embora. Acompanho-te até à ludoteca numa conversa, como sempre, animada. Converso contigo sobre o teu grupo de jovens. Não me adaptei ao meu novo grupo e penso na possibilidade de ir para o teu. Demonstras algum entusiasmo e continuas a falar sobre as vossas actividades.

Já estou dentro do autocarro. Levo para casa uma cara especialmente alegre, talvez porque nada me correu mal neste dia em que as cores do céu de fim de tarde se confundem com as das folhas das árvores.

Um belo dia de sol de Outono...!

domingo, outubro 24, 2004

Parece que hoje vai chover

Querido Luís,

O dia está cinzento. Durante a noite choveu bastante.

Sonhei contigo. Sonhei que rejeitavas a minha companhia. Sonhei que estavas diferente, sonhei que estavas indiferente. Mas tu não és assim... Nunca foste. Sempre nos demos muito bem, sempre foste muito meu amigo, mas no meu sonho não eras assim. Não, não acredito na interpretação dos sonhos, não acredito que eles nos digam algo. Reflectem o nosso subconsciente, um mundo dentro de nós próprios que não conhecemos, nada mais...

Dou-te um toque para ter a certeza de que tudo está bem. Tu respondes. Respiro de alívio. O meu sonho não passou de um pesadelo.

Parece que hoje vai chover...

sábado, outubro 23, 2004

Onde estás tu?

Querido Luís,

É sábado. Finalmente, posso descansar depois de uma semana complicada. Complicada por duas razões: porque tive muito que fazer na escola e porque passei a semana a tentar resolver os meus problemas com o Pedro.

Ontem estive até tarde a conversar com ele para saber o que é que ele pretende fazer quanto à nossa relação. Não conseguimos concordar com nada. Ele acha que eu tenho falta de tempo para ele, a mim não me parece ser esse o problema. Eu tenho muitas actividades extra-curriculares, coisas que faço desde pequenina, desde que me lembro... Agora no 12º ano, o trabalho é redobrado e, por isso, o meu tempo livre é bastante reduzido. Como não vivemos perto um do outro, tudo piora. Mas estudamos juntos! Se eu me sentisse completa nos momentos que estou com ele, por muito curtos que sejam, tudo seria diferente. Não íamos ter esta sensação de nunca estarmos um com o outro. Porque nós estamos um com o outro, mas não estamos um para o outro.

E tu? Revejo mentalmente todos os pedacinhos de tempo em que convivemos durante a última semana e recordo como me sentia em cada sorriso, em cada olhar, em cada conversa para pedir um lápis emprestado, em cada brincadeira... Fazes-me sentir bem, sabes?

A tua ausência não me faz bem.
Onde estás tu, agora?...

sexta-feira, outubro 22, 2004

É tudo culpa da lua

Querido Luís,


O dia está bonito. Não chove, não faz vento. Vejo-te a subir as escadas à entrada da escola e esboço um sorriso.


Está na hora do almoço, mas hoje não me apetece comer. Estou a estudar no corredor e tu desapareceste, provavelmente foste almoçar a casa, como já é habitual. Compro um lanche no café mais próximo e regresso à escola. O Pedro está à minha espera, discutimos, falamos sobre os nossos problemas... pela enésima vez, não chegamos a nenhuma conclusão e eu desisto. Está na ponta da língua de cada um de nós a frase: é melhor acabarmos. Nenhum de nós a pronuncia, por razões diferentes. Penso que ele não me quer perder e eu não quero fazê-lo sofrer.


Desde que me apercebi que me fazes sentir melhor do que ele, desde que me apercebi de que a nossa amizade significa, para mim, mais do que isso, comecei a sentir-me culpada, errada... Não consigo abandonar o Pedro de uma hora para a outra, ele ia sofrer demais...


Só pode ser culpa da lua, só a lua tem o poder de mover os mares, só a lua poderá ter o poder de alterar os sentimentos das pessoas, de nos fazer amar ou odiar, de nos fazer sorrir ou chorar... A canção da Katie Melua não me sai da cabeça... "Guilty feelings in the night as i wonder is it wrong to feel so right?"...


O Pedro vai sair comigo e com os meus amigos no sábado, mas convidou-te a ti também; para mim, é tudo demasiado estranho.


Apenas quero um lugar para descansar o coração. Não é perto do Pedro, talvez não seja perto de ti... Quero ir para longe, muito longe, para onde nem os anjos me alcancem, para um lugar onde não sinta frio nem calor, um lugar onde não precise de sonhar... Só quero parar a olhar para um céu cheio de estrelas, não quero mais nada.


"So I'll blame it on the moon"


quinta-feira, outubro 21, 2004

Mais um dia normal...

Querido Luís,


Acordo para mais um dia, mais um dia normal. Um dia como os outros.


Perco o autocarro e chego atrasada à aula de inglês. A reacção da professora é a do costume, uma reacção normal. Aceita o meu pedido de desculpas e continua a trabalhar, a ensinar como quem passa o dia a escrever em qualquer espécie de teclado, com o olhar preso num monitor, que neste caso é o livro. Ao menos isso, sempre tem as folhas de papel para virar... Passam 10 minutos e eu ainda não me sinto suficientemente concentrada na matéria sobre os nativos americanos. A minha cabeça está um lugar atrás e volta e meia também o meu olhar se desvia nesse sentido.


Nota-se perfeitamente que não gostas de utilizar guarda-chuva, tal como ontem, estás encharcado. Pergunto-te se me trouxeste o que eu te pedi e tu respondes afirmativamente com uma piada qualquer de bom gosto. E, de resto, já me fizeste habituar às tuas piadas e mesmo participar nelas. Sempre me agradou o bom humor das pessoas. Em ti há muitas outras coisas que me agradam.


Presto um pouco de atenção à professora que se queixa sobre os anos que ainda terá que esperar pela reforma. O tempo vai passando e nós saímos, finalmente.


Vou ter com o Pedro e questiono-o sobre a possível saída no sábado à noite com o meu grupo de amigos. Ele só quer estar comigo. Não é compreensível que após um ano e meio de namoro ainda não tenhamos um grupo de amigos em comum. Fico um pouco chateada, mas não gosto de fazer fitas.


Os alunos do 10º ano estão à porta da sala onde teremos a próxima aula e uma rapariga magra e tímida pede-me para te apresentar a ela. Eu cedo e tu, como sempre, mostras-te acessível. Tentas quebrar o gelo que é sempre criado neste tipo de situações e eu delicio-me com o teu sorriso maroto e meigo ao mesmo tempo.


A disciplina de Físico-Química não me diz nada. O Pedro está entre nós e isso faz-me desligar de tudo, mesmo de ti.
Depois do almoço, temos uma última aula. Nunca gostei de Matemática, mas sempre foi uma aula que passou rápido, talvez por ser a única em que realmente se trabalha. Exercícios, exercícios, mais exercícios.


O Pedro tem que ir embora, tu decides ir até à sala da internet e eu acompanho-te, afinal, tenho que esperar mais de meia-hora pelo autocarro. A nossa conversa é animada. Não, o John não está apaixonado por mim, mas tu insistes nisso. Não digas mais vezes que eu estou a brincar com os sentimentos dele, por favor... Somos apenas amigos e nada mais. O facto de ele me achar bonita nada significa.


Vejo-te uma última vez pela janela do autocarro. É pequeno, tenho que ir em pé, mas ver-te só mais uma vez neste dia normal, vale por tudo.


Até mais ver, talvez noutro dia normal.


quarta-feira, outubro 20, 2004

Na aula de português...


Querido Luís,


Olha só para ti, todo encharcado! Estás, como sempre, atrasado para a aula de português! O que aconteceu ao teu cabelo, parece diferente, cortaste? Ah, ainda está molhado, porque tomaste banho mesmo antes de vir para a aula.


Sentamo-nos e eu fico a olhar-te deliciada. Esse impermeável vermelho fica-te muito bem, sabes?... O Pedro toca-me no braço direito e eu acordo. De repente, tudo parece normal, mais uma aula, continuamos a analisar a poesia de Cesário Verde... E o Pedro ainda está ao meu lado direito, tu estás mesmo à minha frente e eu posso ver o reflexo do teu rosto na janela. Posso ver também que chove lá fora.


Hoje o dia começou mal... Custou-me a acordar e consegui falhar todos os lançamentos ao cesto, na aula de Educação Física. Isso não seria importante, não fosse eu a melhor jogadora de basquetebol da turma. Dali resultou um sermão da professora; não era admíssivel, mesmo antes do torneio.


Sim, eu respondi às perguntas da página 44. Cesário Verde aproxima-se de Eça de Queirós na utilização do adjectivo, utilizando dupla e tripla adjectivação e variando a sua posição. Exemplos não escrevi, mas posso procurar rapidamente. Tu também trabalhaste a mesma página, não foi? Podes sempre ajudar-me! Alguém do outro lado da sala começa a desbobinar um sem fim de exemplos que ilustrem a minha resposta e eu calo-me.
Desculpa, esqueci-me dos CDs que me emprestaste! Não trouxeste mochila? Então até calhou bem, já que não te dava muito jeito, mas desculpa na mesma. Amanhã trago-te sem falta!
O Pedro faz-me cócegas e eu lanço-lhe um olhar de quem não está a gostar da brincadeira. Vou tentar prestar atenção à aula.


A professora dispensa-nos. Segues para a secretaria. Eu vou guardar a mochila no cacifo. Preciso de ir à livraria buscar um livro que encomendei. Alguém quer vir comigo? O Pedro tem que ir para o autocarro e tu, Luís, por acaso não precisas de lá ir? Não, mas precisas de ir para casa estudar. Tens aula de piano mais tarde. Então eu vou lá sozinha, também não é longe.


Pelo caminho encontro gente estranha, sentada à porta de um prédio. Não sei o que fazem ali, talvez seja alguma reunião, não faço ideia. Sou rapidamente atendida, faço mais duas encomendas e volto para a escola, onde ainda te encontro à conversa com a Rosinha da secretaria. Junto-me a vocês e comigo vêm mais 2 alunos e uma empregada. A Rosinha jura que nunca te conheceu nenhuma namorada, na verdade, ninguém te conheceu nenhuma namorada. A mim não me parece estranho, sei bem da tua paixoneta pela Isabel Cristina, no 10º ano. Mas na verdade, nunca te imaginaria com ela...


Vou então apanhar o meu autocarro. Tu vais para casa estudar.


Até amanhã, Luís.